Antonio Carlos Rocha*
No início dos anos 1980, a Faculdade de Letras da UFRJ criou o curso “Português-Japonês”. Tempos depois, um grupo de professores foi ao Japão através de intercâmbio acadêmico.
Certa amiga e professora, do curso Português-Literaturas, portanto, não falava japonês, contou o “mico” que pagou por não saber ler os ideogramas daquele país:
Ao visitar um parque público, notou que vendedores ambulantes ofereciam pacotes de biscoitos. Comprou um e guardou na bolsa. Ao final da tarde, já de volta no trem que a levava para o hotel, sentiu fome. Naturalmente abriu a bolsa, abriu o citado pacote e pôs-se a comer o biscoito.
Nesse momento, os japoneses que estavam sentados à frente dela no vagão, começaram a rir e explicaram que aquele biscoito era para dar aos veados que habitam o parque, como aqui, no Ocidente as pessoas compram milho para os pombos.
Ela argumentou que o pacote não tinha uma única frase em inglês, tudo em japonês daí a gafe. Mas todos riram inclusive ela.
A curiosidade acima me fez lembrar do escritor e médico Cláudio de Souza (1876-1954), membro da Academia Brasileira de Letras, em seu livro Impressões do Japão, publicado em 1940 pela Editora Civilização Brasileira.
O autor visitou o País do Sol Nascente em 1940, andou de norte a sul, era um apaixonado pela cultura nipônica. O veado é um animal especial no Budismo; em muitos quadros, paisagens e afins, vemos o Buda meditando na floresta tendo ao lado os pacíficos animais.
À página 157 Cláudio de Souza escreve:
“Não vos apresseis. Vamos permanecer por mais alguns momentos na lenidade do bosque. Aproxima-se um vendedor de cartuchos com biscoitos leves para os animais sagrados. Metei a mão no bolso; trazei para fora o porta- moedas. Por alguns cents o vendedor sorridente nos vende um cartucho. Os veados de Nara – estamos em Nara – viram nosso movimento e vem acudindo. Estendei-lhes a mão com o biscouto. Sentirei suas línguas húmidas e tépidas molhar-vos os dedos.
Naquele cenário e naquele ato bucólico perguntareis de novo:
- Estamos no ano da graça de 1940, ou ainda naquelas priscas eras em que homens e animais formavam uma só família nos bosques mitológicos?”.
(*) Antonio Carlos Rocha é escritor.
domingo, 8 de fevereiro de 2009
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